Quase dois meses após rebentar a crise Galamba/SIS, que monopolizou as atenções e provocou uma fratura entre Presidente da República e primeiro-ministro, a percentagem dos que acham o Governo de António Costa “mau” ou “muito mau” é a maior de sempre (71%) — mesmo entre os simpatizantes do PS há 46% que dão nota negativa ao trabalho do Executivo —, mas o maior partido da oposição não ganhou nada com isso. Aliás, ninguém na oposição ganhou.

Pelo contrário, segundo a sondagem do ICS/ISCTE para o Expresso e a SIC, não só o PSD fica na mesma (30%) nas intenções dos inquiridos sobre como votariam se houvesse hoje eleições legislativas como o PS sobe um ponto (para 31%) relativamente à sondagem de março. Aparentemente, o caso Galamba não fez mexer os ponteiros e os dois protagonistas principais do braço de ferro suscitado por esta crise, o Presidente da República e o primeiro-ministro, acabam por ganhar os dois, subindo duas décimas cada um, embora Marcelo Rebelo de Sousa continue muito à frente de António Costa.

Na escala de 0 a 10, Marcelo continua a ser a figura política mais bem avaliada (6,7) e a única com nota positiva. Mas Costa, embora com cotação negativa (4,8), aguentou-se no embate com o Presidente, cujo pedido para que demitisse o ministro das Infraestruturas pura e simplesmente ignorou. Já Luís Montenegro, que fechou 2022 com 4,5, não conseguiu capitalizar com a oposição movida ao chefe do Governo nesta crise e cai três décimas relativamente a março, ficando-se por 3,9, abaixo de Catarina Martins, que deixou a liderança do BE no último dia do trabalho de campo desta sondagem e sai com 4,1, e apenas acima de Inês Sousa Real e Rui Tavares, que empatam nos 3,3, Paulo Raimundo e Rui Rocha (3,2) e André Ventura, o pior classificado, que cai quatro décimas e fica-se por 3,0.

Muito em linha com a primeira e segundapartes desta sondagem divulgada nas últimas duas semanas, a maioria dos inquiridos — que há 15 dias vimos discordar da decisão do primeiro-ministro de manter João Galamba, mas nem por isso defender eleições antecipadas, e na semana passada ficámos a saber estar profundamente frustrada com o estado do país — confirma agora dar uma negativa pesada à atuação do Governo, mas continua sem antecipar grandes mudanças no jogo ou querer premiar o maior partido da oposição.

Feitas as contas, e com a ressalva de o trabalho de campo desta sondagem ter sido feito fora de um contexto eleitoral, o que leva os seus responsáveis a alertar que não estão aqui “intenções de voto plenamente cristalizadas e menos ainda previsões de um qualquer futuro resultado eleitoral”, os sinais possíveis dizem-nos que a direita — PSD (30%), Chega (13%), IL (4%) e CDS (1%) — somaria hoje 48%, enquanto a esquerda toda junta — PS (31%), BE (5%), CDU (5%), PAN (2%) e Livre (1%) — ficaria quatro pontos abaixo, com 44%. Um resultado muito similar ao de março — o relatório do ICS/ISCTE diz que, “do ponto de vista estatístico, é mesmo equivalente”. Como se os episódios “deploráveis” (palavras do primeiro-ministro) ocorridos no Ministério das Infraestruturas, que envolveram polícias, acusações de “roubos” e recurso ao SIS de legalidade questionável e levaram o Presidente da República a falar de “custos objetivos na credibilidade, confiabilidade e autoridade do ministro e do Estado”, não tivessem, afinal, manchado mais a imagem de uma maioria socialista que já caíra 14 pontos nas sondagens em pouco mais de um ano. Tirando o CDS, que desceu de 2% para 1%, e o PS, que subiu de 30% para 31%, todos os outros ficaram na mesma. O país parece continuar avesso a mudanças.

Para o partido liderado por Luís Montenegro esta sondagem significa que continuaria dependente de André Ventura para atingir uma maioria absoluta — somado ao IL e ao CDS, o PSD ficar-se-ia pelos 35%, acima do PS, é certo, mas abaixo de uma muito possível concertação à esquerda. E os socialistas nunca quiseram responder se viabilizariam um Governo minoritário do PSD, da mesma forma que o PSD ainda não disse que recusaria ser Governo se para isso dependesse dos votos do Chega.

Sinal positivo para Montenegro poderá ser a tendência que parece confirmar-se de uma queda continuada da avaliação do Governo, que tem sido sempre mais negativa do que positiva desde setembro de 2022, “um padrão raramente observável nos anos anteriores”, segundo se lê no relatório. Apostar num desgaste continuado e imparável desta maioria socialista tem sido a estratégia do líder do PSD, que por isso mesmo chegou sem grande pressa, tendo apenas sido obrigado a acentuar os ataques ao Governo após Marcelo Rebelo de Sousa agitar o papão da dissolução contra uma “maioria requentada”, que o primeiro ano do Executivo, ensombrado por sucessivos casos, ajudou a confirmar. Com o Presidente da República espicaçado por uma maioria de eleitores, que o querem mais exigente e vigilante, a não dar sinais de aliviar a pressão sobre o Governo, Montenegro poderá ter nas europeias do próximo ano o teste decisivo à sua liderança. A menos que, se o Governo conseguir acertar o passo e a tendência para a modorra eleitoral se confirmar em próximas sondagens, o líder do PSD ganhe tempo e espaço para perguntar: qual é a pressa

  • astrologic@sopuli.xyzOP
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    1 year ago

    Surpreendentemente, nem o PSD nem o Chega conseguiram capitalizar, talvez porque a população reconhece a fantochada que tem sido a CPI de ambos os lados.

    Parece que estamos num impasse sem saída à vista.